Por um recomeço

Flamengo da Gente
3 min readApr 17, 2018

--

No dia 17 de abril de 2018, o Flamengo treinou para sua torcida. Noutros tempos, o fato seria corriqueiro, comum o suficiente para se confundir com a própria identidade de um clube em que energia e pressão se transformaram em parte do DNA. Da Praia do Russel à Gávea, de passagem pela Rua Paissandu, os “aprontos” do Flamengo sempre foram ocasiões de encontro, de face a face entre torcedor e atleta. Nos dias de hoje, não. Nos últimos anos, o Flamengo treinou como se despachasse numa repartição, em sossegado expediente interno, vigiado apenas por profissionais, dirigentes e mosquitos de Vargem Grande, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. A estratégia, desenhada por intermediários e promovida pela cúpula, visava assegurar aos atletas a privacidade. Longe da Gávea, e da memória residual de “bagunça” e “esculhambação”, o futebol do Flamengo poderia enfim trabalhar em paz. Preocupação justa, natural até — só que, no meio do caminho, o futebol se separou do Flamengo. Pois o futebol do Flamengo sem encontro não é o futebol do Flamengo. O 17 de abril de 2018 veio relembrar o óbvio, o óbvio de ruído e fumaça, o óbvio de grito e bandeira, o óbvio que tomou o Novo Maracanã.

Mais de 45 mil torcedores foram ao estádio numa terça à tarde, dia útil, ver um time bater bola. Foi a véspera de um jogo de primeira fase de Libertadores, sem a transcendência de uma semifinal ou final. O que ocorria ali de diferente? A reboque de adversários (logo o Flamengo, da Praia do Russel!), sob pressão do que é e do que não pode deixar de ser, um Flamengo que relutava em ser o Flamengo inteiro enfim decidiu cumprir o lema de Mario Filho e “deixou se amar”. Os ingressos, na forma de alimentos não-perecíveis, pesaram 30 toneladas apenas nas lojas oficiais. Enfileiradas, a considerar como unidade uma embalagem de arroz de 1 quilo, essas “oferendas” cobririam algo perto dos 8 quilômetros que separam o Novo Maracanã do terreno onde o clube foi fundado, no bairro do Flamengo, em 1895. Tanta distância e tanta carga são as medidas da energia represada de uma massa expulsa das arenas pelos preços, recolhida aos bares e às casas. Ocorre que, da mesma forma que a rotina de treinamentos, a paixão pelo Flamengo não pode nunca ser completamente privada: em algum momento, ela explode junta.

Arena de shows, canteiro de festas, circo de um futebol caro e cada vez mais raro, o Novo Maracanã nunca havia juntado tantos para ver tão pouco. A lição é clara. Não há Flamengo sem número. Sem número, não há marca. E sem marca não há sequer planilha que resista ao teste do tempo. Que o Flamengo entenda e se entenda: precisa abrir os portões para seguir Flamengo. Primeiro, os da arquibancada. Depois, os do próprio clube. A verdade tem vermelho e tem preto. Nós não esquecemos.

--

--

Flamengo da Gente
Flamengo da Gente

Written by Flamengo da Gente

Movimento de torcedores, sócios-torcedores, sócios e conselheiros que defende um Flamengo vencedor, justo, democrático e popular. #NãoEsquecemos

No responses yet