Não podemos errar
Nós, homens e mulheres, sócios, sócios-torcedores e interessados em se associarem ao Clube de Regatas do Flamengo, reunidos sob a tenda comum do grupo Flamengo da Gente, repudiamos as ameaças às liberdades e às garantias constitucionais que, transformadas em ingredientes venenosos de uma receita política, perigam matar a democracia brasileira por meio do voto. Concordamos, mais do que nunca, com o diagnóstico do antropólogo Darcy Ribeiro, que uma vez descreveu o Brasil como “um país enfermo de desigualdade, de brutalidade e de perversidade”. Não acreditamos que mais desigualdade, mais brutalidade e mais perversidade possam vir a solucionar questões que, bem à maneira brasileira, são de uma só vez perenes e urgentes.
Na presente campanha para a presidência da República, o líder nas pesquisas de opinião conseguiu, de maneira bem-sucedida, vender homofobia, racismo e machismo como marcas de autenticidade, a ponto de neutralizar, em alguns públicos, a rejeição ao conteúdo de suas próprias propostas. Um Brasil para maiorias? “Modo de expressão”. Mulheres devem receber menos do que homens? “Apenas uma constatação”. Preferir um filho morto a um filho gay? “Exagero em nome de alguma verdade”. Descendentes de escravos devem ser tratados como gado? “Mimimi” — eis aí a definição de cegueira.
Nada, na história das democracias, autoriza a descontar como bravatas ataques abertos contra segmentos sociais inteiros e seus direitos. Sejam esses ataques enunciados por líderes, ou por simpatizantes, como torcedores que, num recente clássico mineiro, “alertaram” adversários sobre o extermínio de homossexuais num eventual futuro governo. Até quando confundiremos pulsão de morte com traço de estilo?
Mas o que o Flamengo tem a ver com isso? Nós, do Flamengo da Gente, não esquecemos. Não esquecemos do Flamengo de Stuart Angel e de Marielle Franco. Não esquecemos do Flamengo da Fla-Gay, da Fla-Anistia e da Fla-Diretas. Não esquecemos do Flamengo que, no auge da Ditadura Militar, foi tomado por uma frente de sócios que ousava dizer que “A democracia começa pelo Flamengo”.
Pois bem. Afirmamos que a democracia ainda começa pelo Flamengo e que Jair Bolsonaro, falso messias nascido do cansaço, da raiva e do medo, não deveria ter lugar de honra nessa democracia, menos ainda no topo dela. Postulamos um Brasil e um Flamengo plurais. Ao negar um Brasil plural, Bolsonaro nega um Flamengo plural, mesmo sem saber.
Que os flamengos se enxerguem.